21 de out. de 2011

Trade Marketing ou Marketing do Trade?

A palavra “Trade”, que traduzida literalmente significa comércio, tem sido cada vez mais utilizada entre o pessoal de marketing e vendas. Não se trata do significado tradicionalmente voltado ao comércio exterior, um termo usado para indicar negócios feitos entre empresas de países diferentes através das Trade Companies.
O trade, utilizado aqui no mercado interno, ganhou notoriedade a partir do momento que os intermediários, principalmente o varejo, passaram a ter mais poder no Canal de Distribuição. Na verdade estes sempre foram chamados de “trade” por aquelas empresas nitidamente influenciadas pelas escolas de marketing dos Estados Unidos.
No canal de distribuição, de um simples papel de facilitadores dos fabricantes os intermediários passaram a decidir o que seria disponibilizado aos consumidores final, como e quando seria e por quanto seria. Como conseqüência, numa situação totalmente nova, os fabricantes passaram a depender fundamentalmente das decisões do varejo e dos distribuidores.
O desafio para os fabricantes passou a ser criar as condições necessárias para que seus produtos passem pelos intermediários (varejo), de uma forma rápida e lucrativa para cumprir a promessa de valor para seus consumidores.
É uma nova área de competência na gestão mercadológica. Não é só uma decisão de comunicação no ponto-de-venda para uma ação promocional. Abrange decisões financeiras relativas ao preço de venda e de revenda, decisões sobre a logística de entrada no varejo e dentro do varejo, decisões sobre agrupamentos de produtos, embalagens, etc. Obriga um conhecimento mais amplo da relação de cada consumidor, com cada loja de varejo e a que estímulos eles estão mais sensíveis, e em como transformar esta relação e estimulo em negócios para o fabricante.
Não é uma competência da área do marketing da empresa porque este tradicionalmente esteve focado no consumidor, o “Consumer Marketing”, e não tem a experiência e vivência do marketing através do varejo, em toda sua amplitude.
Não é uma área de competência de vendas porque vendas, por tudo que possamos ter incluído de capacitação e preocupação em sua gestão, ainda não adquiriu através de sua equipe de vendedores, a direção prática da estratégia mercadológica para a tomada de decisão de um processo de vendas. Mesmo que não queiramos, a gestão de vendas ainda está focada no fechamento do mês. Aí ela é mais tática que estratégica. E a atuação de seus profissionais são o reflexo desta situação.
Não sendo uma área de competência de marketing ou de vendas foi necessário desenvolver uma nova área da gestão da empresa. Uma área focada no desafio de fazer passar o produto pelos intermediários principalmente o varejo.
O Trade Marketing, portanto não é o marketing dos intermediários. É o marketing através dos intermediários. Uma nova área de competência.
Mesmo sendo uma nova área de competência, cabe alertar que continuará existindo uma relação íntima entre a preparação e a execução. A preparação, responsável pela arquitetura mercadológica, virá do Trade Marketing enquanto disciplina de retaguarda. A área de execução, a construção do processo mercadológico no mercado será representado pela área de vendas. E esta área, por sua vez, deverá adquirir novas formas de trabalhar, muito mais ampla, muito mais conseqüente com o resultado de seu cliente. É o piloto de um Fórmula 1 (vendas) e sua equipe de engenheiros (a equipe de Trade Marketing).
Mas por que tudo isto ocorreu? Até os anos noventa encontrávamos o seguinte cenário: Eram poucos os fabricantes. A qualidade de seus produtos era efetivamente superior a seus concorrentes diretos, suas marcas eram fortes a ponto de serem confundidas com seu segmento de mercado;
Em função da inflação reinante até então o melhor argumento de vendas era “compra porque a tabela vai aumentar” e a conseqüência era uma distribuição sob pressão com o fluxo de produtos empurrado em direção ao consumidor;
A comunicação era a de massa, o veículo principal era a televisão e a promoção de vendas tinha o objetivo de “baixar” o estoque no ponto-de-venda ou, então, mesmo ajudar a empurrar os estoques dos distribuidores/atacadistas em direção ao varejo;
O consumidor fazia grandes compras para proteger seu salário ao final do mês e procurava não arriscar esta compra com marcas que não as tradicionais. Era, portanto fiel a elas. Tinha baixo conhecimento das opções existentes e não se sentia seguro em arriscar trocar as tradicionais porque não se sentia protegido;
O varejo procurava ir em direção ao consumidor e à sua fidelidade. Por sinal esta sempre foi a sua missão: interpretar e disponibilizar a demanda desejada por seus clientes. Tinha baixo poder para influenciar qualquer modificação da cesta de compras;
Para “provocar” seus clientes autorizava os grandes fabricantes a desenvolver ações de merchandising de grande impacto com grandes áreas de exposição e por ações de promoção de vendas do tipo “leve 3 pague 2” que, em últimas palavras, ajudava a empurrar os estoques para a casa do consumidor. Os espaços de exposição, a gôndola e os produtos que ali eram expostos, eram determinados (gerenciados) com a estreita colaboração dos fabricantes justificado pelas ações de comunicação propaganda realizada pelos fabricantes.
Um marco significativo! Um fato determinante representa o marco desta significativa mudança nas relações e percepções. Um instituto de pesquisa americano (POPAI) veio ao Brasil e fez uma avaliação do grau de planejamento das compras realizadas por consumidores em supermercado. A conclusão foi bombástica: uma grande parcela dos compradores, cerca de 85%, tomava a decisão do que comprar apenas no ponto-de-venda. Alguns decidiam apenas pela categoria de produto. Outros nem categoria nem mesmo o que comprar. E apenas 15% saíam de casa com lista do que comprar com suas respectivas marcas. Em outras palavras um grande número de pessoas não planejava suas compras, muitas vezes, comprando por impulso provocado por algo dentro da loja.
O porquê desta mudança: Comparando com a situação anterior vamos encontrar um consumidor mais maduro fruto de sua maior autoridade no processo da compra (o Código de Defesa do Consumidor foi um marco para isto). Com uma moeda mais estável as compras passaram a ser feitas em menor quantidade e mais vezes durante um período. Afinal não é mais necessário “proteger” o salário. Por comprar em menor quantidade passou a arriscar mais, experimentando outras marcas. Por experimentar outras marcas descobriu a pouca diferença entre a qualidade dos produtos existentes nas prateleiras. E, como conseqüência, deixou de lado a fidelidade às marcas tradicionais;
Isto foi possível também pelo grande número de novos fabricantes e produtos ofertados ao mercado. A qualidade já não é mais reserva diferencial de alguns produtores: é acessível e não onera o custo de venda. Ao contrário qualidade comoditizada reduz custo e aumenta a competição pelo preço baixo, a forma mais simples de atrair quem compra para revender e quem compra para seu próprio uso.
O grande número de fabricantes dividiu o “bolo” dos consumidores em fatias menores. Com potencial de volume menor os investimentos em imagem de marca foram prejudicados pela baixa lucratividade resultante deste baixo volume e pela “guerra de preço baixo”. A solução, na maioria das vezes, para trabalhar a comunicação de marca tem sido a de investir no ponto-de-venda, garantindo de um lado giro de seus produtos, o objetivo maior do varejista e do outro prejudicando a construção de imagem de marca pelo imediatismo das ações pontuais.
O poder agora está do outro lado - O varejo, por sua vez, ficou com a melhor parte desta radical mudança. De simples facilitador do processo de levar o produto ao consumidor final passou a ter o poder de decidir o que deve ser levado ao consumidor. E como deve ser levado: preço, local de exposição, destaque nas suas ações de comunicação e assim por diante.
Se as decisões de compra dos clientes do varejo são tomadas no ponto-de-venda frente ao que ali está exposto, se os clientes aceitam experimentar opções do que comprar, se o número de fornecedores do varejo aumentou significativamente, se existem pelo menos três grandes marcas como opção de compra em cada da categoria de produto, por que não exercer este poder dentro desta situação? É uma situação clara e inevitável.
Agora, para o fabricante vender ao consumidor terá de passar por este poder. Terá de “pagar pedágio” para chegar ao consumidor final. E é dentro deste cenário que vamos encontrar o desenvolvimento de uma nova área de competência do marketing. O marketing através do intermediário. O Trade Marketing.
Área de atuação do Trade Marketing - O foco fundamental do Trade Marketing é unir as necessidades dos consumidores com as necessidades do varejo com a oferta de sua marca. Para tanto deverá estar focado no desenvolvimento das relações entre o fabricante e o canal de distribuição para poder chegar ao consumidor. O consumidor continuará sendo estudado e focado pelo Marketing Tradicional. O Trade Marketing deverá ter íntima ligação com o Marketing Tradicional para dar continuidade à proposta de valor do produto e vice-versa.
Para que isto ocorra as áreas de estudo do Trade Marketing deverão ser: como aplicar os 4 Ps (Produto, Preço, Promoção no sentido amplo de comunicação e Praça) na interface do varejo.
Bases para o Trade Marketing Como a base do raciocínio em relação aos intermediários, principalmente o varejo, não custa lembrar que: Varejo compra produtos pelo que rendem não pelo que ele faz para o consumidor (giro é palavra-chave).
Varejo gerencia categorias de produto e não marcas isoladas. Cada categoria, de cada loja tem um portfólio específico de tipos de produtos para atender necessidades específicas de sua área de influência. Compartilhar/capturar informações através de troca eletrônica de dados ajuda a gerenciar estoques e medir a saída do produto facilitando processo de reposição adequada de estoque evitando ruptura de estoque e fornecimento exagerado de produto por ponto-de-venda.
Atender às necessidades da logística do varejo é ponto fundamental para a manutenção de uma relação sadia. Ações de ponto-de-venda podem ser bem aceitas desde que estas não sejam exageradas como benefício exclusivo da marca e pouco do ponto-de-venda.
Planos de apoio de comunicação da marca no ponto-de-venda serão bem aceitas e ajudarão a estreitar o relacionamento comercial desde que contenham a importante tarefa de também promover a imagem do local.
Vendas e o Poder do Varejo - Dentro deste cenário vendas deve representar uma nova interface com os canais de distribuição principalmente o varejo.
O vendedor deve ser um especialista num determinado cliente (ou grupo de clientes) pois é através deste conhecimento e especialidade que serão desenvolvidas as melhores ofertas.
Vendedor deve desenvolver conhecimento e habilidades mais que as da negociação em busca do pedido do cliente. Deve ser um gestor do relacionamento do cliente para com a empresa através da área de vendas, logística, comunicação e finanças.
Portanto, vendas passa a ter a autoridade para executar não só o processo da venda para o cliente como também:A negociação dos serviços logísticos da entrega e redistribuição.
As ações de comunicação de merchandising para garantir a visibilidade do produto e sua compra;
As ações de promoção vendas para provocar giro acelerado incentivando maior lucratividade;
As campanhas cooperativas para provocar demanda por seus produtos na lojas;
Além de todo processo financeiro para garantir de um lado que o objetivo do varejo seja alcançado (lucro pelo giro).
É um novo vendedor dentro da organização. Tem como tarefa a realização destas áreas da relação com o varejo e ainda gerar lucro para o fabricante.
Um desafio para equipes bem preparadas.

Por: José Luiz Meinberg - Consultor do MVC – Instituto MVC Estratégia e Humanismo. Professor da FGV-RJ, Pós Graduado em Planejamento Estratégico pela Columbia University (USA). Por mais de 25 anos ocupou cargos executivos na CICA (SP), Bacardi (RJ), Heublein (SP), Emulzint (RJ) entre outras. Estruturou e tem ministrado diversos cursos voltados para a área comercial de empresas. Sua área de atuação está voltada para a Negociação e Gestão Comercial abrangendo programas de Negociação, Vendas, Distribuição, Logística, Comunicações, Marketing de Relacionamento, Marketing e Gestão Estratégica de Serviços tanto para o setor do comércio, da indústria e de serviços. Co-autor do livro de Gestão de Vendas para os cursos de MBA da Fundação Getulio Vargas, editado pela Editora FGV
Fonte: Porta Fator Brasil

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...