Parte I: Primeiro mapeie o terreno, depois defina a estratégia.
Você já parou para pensar “onde”
a experiência acontece? Quando as luzes se acendem no cinema ao final de uma
sessão, escutamos diferentes comentários sobre o filme que acabamos de
assistir. Sem grande esforço é possível perceber que embora tenham visto a
mesma obra, cada um viu o filme a sua maneira, prestando atenção em coisas
diferentes, processando segundo seus padrões de pensamento e finalmente,
produzindo uma experiência própria. Onde aconteceu a experiência? Na mente do
expectador e não na sala de cinema.
No mundo do varejo é a mesma
coisa: a experiência de compra do shopper dentro de uma loja ou num website é
sempre pessoal, interna e, portanto um pouco imprevisível. Para sorte dos
nossos designers de experiências, investigando-se o shopper, é possível chegar
a alguns agrupamentos de pessoas com “backgrounds” (tradução livre: histórias
de vida) e modelos mentais que se refletem em comportamentos semelhantes, o que
torna possível a segmentação dos clientes de uma loja ou rede. Além disto,
possibilita o reenquadramento do diálogo e ambiente da loja para que façam
sentido para cada um desses segmentos, aumentando a conversão.
Parte II: o sucesso é uma questão de “Rapport” com o shopper
O sucesso da comunicação das
marcas de fabricantes de bens de consumo e dos varejistas com o shopper se
baseia fundamentalmente em criar uma espécie de sintonia com os diferentes
segmentos de shoppers que visitam um estabelecimento de varejo. Esta sintonia é
chamada de “rapport”. Quando um vendedor de seguros conhece a estratégia de
aposentadoria de um prospect ele tem muito mais chances de fechar a sua venda.
Isso funciona com vendedores de seguros, carros, roupas e também funciona no
auto-serviço.
Aqui em Nova York, por exemplo,
aqueles que visitaram a Abercrombie & Fitch (A&F – loja de roupas) pela
primeira vez se surpreenderam com seu ambiente no estilo “balada”, com luzes
estroboscópicas, música alta e pessoas malhadas em fotos nas paredes e atrás
dos balcões. Torsos masculinos depilados em fotos preto-e-branco nas paredes e sacolas
certamente atraem a atenção de alguns, mas desagradam outros. Essa estratégia
muito bem focalizada de comunicação é a base do sucesso da A&F que criou
uma legião de fãs entre os adolescentes de todo o mundo.
No Brasil, a Chilli Beans é, para
mim, o melhor exemplo de como uma loja pode entrar em sintonia com seu público
em vários níveis, criando uma experiência única. Mesmo num quiosque dessa marca
de óculos, relógios e acessórios, é possível reconhecer a assinatura marcante
dos seus criadores e o seu foco no público jovem. Eles tiveram êxito em definir
um alvo claro e conectar-se com ele no ponto de venda em todos os níveis
neurológicos da experiência. Vou explicar esse conceito: nossas experiências
são processadas em nossa mente em 5 níveis ligados à própria forma como nosso
cérebro foi “desenhado” para atuar:
a) Ambiente: é o mais instintivo
dos níveis, gostamos ou não de um ambiente sem nem mesmo sabermos por quê.
b) Comportamento: envolve algumas
emoções associadas ao efeito “amor à primeira vista”. Simplesmente nos sentimos
bem ou mal dependendo de como somos recebidos. É instantâneo: um garçom
desavisado pode arruinar nossa experiência com um simples comentário, por
exemplo.
c) Identidade: a identidade está
ligada ao sistema imunológico. Assim, nos sentimos mais confortáveis entre
semelhantes. Daí o sucesso da loja de bonecas e roupas de infantis American
Girl. Nela as crianças podem comprar bonecas que se parecem com elas mesmas e
depois vestirem-se com roupas iguais as da boneca que a mimetiza. É genial e
vai direto ao centro da identidade das crianças e das mães. Todos são pegos
desguardados pelas lindas bonequinhas.
d) Crenças e valores: eles
refletem a forma como fomos criados, educados, aquilo em que acreditamos. Esse
tipo de pensamento é processado pelo cérebro no córtex, a região mais nova na
evolução humana. Muitas pessoas decidem não comprar produtos testados em
animais por uma questão de valores. As crenças mostram como as pessoas julgam
os acontecimentos. Por exemplo, a discussão sobre privacidade nas mídias
sociais envolve uma discussão de valores baseados em crenças pessoais. As
pessoas que gostam de Macs tem a crença de que eles são melhores do que os PCs,
e assim por diante.
e) Além da identidade: esse é um
tipo de experiência que pode ser chamada de “espiritual” porque envolve a forma
como nos vemos e vemos os outros inseridos no mundo. As grandes aspirações
humanas e os sentimentos mais nobres como a compaixão acontecem nesse nível.
Quando uma marca está envolvida sinceramente em ajudar a comunidade, percebemos
isso e nos conectamos com ela. Uma vez ouvi do vice-presidente de design da
P&G – Phil Duncan – o conceito de “brand karma”. Ele explicou que quando
fazemos o bem ganhamos dinheiro. Acertou em cheio no último nível da experiência.
Como um varejista pode criar uma
estratégia de sucesso usando os níveis neurológicos da experiência no processo
de compra?
Parte III: Sete passos para criar uma experiência de compras memorável.
Todo varejista de produtos de
consumo quer vender mais. Isso somente é possível com uma de duas estratégias:
aumentar o tráfego de pessoas na loja ou aumentar a conversão de vendas dentro
da loja, fazendo com que os shoppers comprem mais.
Listei sete passos que qualquer
varejista pode usar para guiar sua estratégia de neuromarketing de experiência
para aumentar a conversão de shoppers em suas lojas:
1) Conheça seus shoppers. Invista
em pesquisa, análise de dados, observe-o no ato, interaja sem medo, esteja onde
eles estão (na loja, no facebook, no estacionamento, etc.) e principalmente
escute-os. Sem conhecer o funcionamento da mente dos shoppers é impossível
conectar-se com eles.
2) Crie uma segmentação. Ela pode
ser baseada em perfil demográfico, comportamento de compra e/ou motivações de
compra. Isso vai garantir mais eficiência na comunicação com os shoppers mais
tarde.
3) Escolha o(s) segmento(s)
predominante(s). Idealmente é aquele no qual sua empresa já tem mais afinidade
e por tanto tem mais chances de sucesso.
4) Avalie se os valores da
empresa coincidem com os valores desse grupo. Se isso não acontecer, o
resultado será uma fraude rapidamente percebida pelo público-alvo.
5) Conecte-se. Uma experiência de
compra genuína será criada por meio da transformação da estratégia em prática.
Assim, sua comunicação, sortimento, atendimento e design com o grupo escolhido
de shoppers serão percebidos na interação deles com o ponto de venda. (Os
níveis são: ambiente/comportamento/identidade/crenças e valores/espiritual).
6) Estabeleça canais de
comunicação de mão-dupla com seu público na loja, na web e na comunidade.
Participar da vida social dos shoppers aumenta o senso de identidade com a
loja. A Chilli Beans, por exemplo, ao vender ingressos para concertos de música
jovem estabelece um vínculo com seu público por meio do gosto musical. A marca
de whisky Buchanna’s o faz patrocinando eventos de jazz, por exemplo.
7) Crie uma assinatura que
envolva os cinco sentidos dos shoppers. Isso deixa a experiência mais completa
e mais memorável ainda. Se bem trabalhados, os sentidos irão funcionar a favor
de sua marca. Não é a toa que os jeans da A&F têm um cheiro característico
que demonstram sua autenticidade. Eu nunca vi um chip Intel, mas reconheço o
seu selo e a musiquinha quando escuto. Por quê? Porque os sentidos nos ajudam a
reconhecer as marcas instintivamente.
Parte IV: Usando os cinco sentidos para criar uma experiência
memorável.
Confunde-se muito o marketing de
experiência com o uso dos sentidos, ou melhor, das sensações para estimular os
shoppers durante a compra. Vamos esclarecer uma coisa: os sentidos são as
portas, não a experiência.
Escutamos uma música romântica
hoje e somos elevados às alturas. Quando o romance acaba a mesma música é fonte
de dor. A experiência acontece na mente. É como nos relacionamos no nível do
instinto, das emoções e do pensamento com tudo o que os nossos sentidos
capturam da natureza. Ou seja, tudo o que vemos, ouvimos, sentimos, degustamos
e cheiramos. Por exemplo, o cheiro do McDonald’s é inconfundível. Certamente é
uma assinatura sensorial da marca.
Uma vez tive uma experiência
desagradável. O prédio em que trabalhava teve um problema e o alarme de
incêndio disparou. Fiquei impressionado porque ninguém desceu, mesmo com o
perigo iminente. Algum tempo depois, no mesmo edifício, onde também funcionava
uma parte da fábrica, o alarme tocou novamente. Dessa vez havia cheiro de
plástico queimado no ar. Todos desceram imediatamente! Por que isso aconteceu?
Porque ao envolver mais de um sentido, a mensagem ganha mais credibilidade.
Pense que você está comprando
queijos no supermercado. Embora a aparência esteja boa, se o cheiro do queijo é
rançoso irá afastá-lo da compra. Nós confiamos muito em nossos sentidos. É
possível extrair vantagem desse aspecto neurológico a favor de uma marca.
Para utilizar os sentidos a seu
favor é preciso “descontruir” a marca em diversos atributos, elegendo alguns
sensoriais que distingam a sua marca e fiquem na lembrança dos shoppers. O
formato da garrafa de Coca-Cola é um excelente exemplo disso. É uma assinatura
visual e táctil da marca que pode ser reconhecida mesmo sem sua logomarca em
qualquer parte do mundo. Suas músicas também são percebidas e reconhecidas
instantaneamente quando escutadas.
Da mesma forma, a Victoria
Secret´s, rede de lojas de lingerie americana, possui uma sacola característica
rosa de listras negras (apenas uma das assinaturas visuais da marca
cuidadosamente desenhada). Além disso, a fragrância característica das lojas é
inesquecível pelas suas shoppers.
Em outro segmento, um banco na
Colômbia (Grupo Helm) usa uma cor específica – como a do Itaú – mas vai além.
Eles também têm uma fragrância própria em suas instalações, sons diferentes em
cada parte das agências e até oferecem docinhos com marca e sabor únicos para
envolver todos os sentidos dos seus clientes na experiência com sua rede. Os
caixas eletrônicos dessa instituição são os únicos onde se pode sacar dinheiro
sentado em apoios acolchoados, para deleite do tato e da coluna.
Todos os sentidos podem levar a
emoções. A música, por exemplo, tem um poder muito forte de provocar
emocionalmente os indivíduos. Mas são a dupla olfato e paladar que estão
diretamente ligados ao afeto. Isso acontece porque desde quando somos bebê,
aprendemos a gostar de quem nos alimenta e estabelecer um vínculo afetivo com
eles, a começar por nossas mães, é claro. Comida é afeto. Isso é tão verdadeiro
que muita gente come para sentir-se mais feliz ou quando está deprimido.
Quando queremos comemorar algo o
que fazemos? Saímos para jantar! É simples assim. Pensando nisso, algumas lojas
de luxo oferecem pequenos mimos para seus clientes. Chocolates, trufas,
biscoitos, sucos e até champanhe são oferecidos aos clientes, criando um
vínculo afetivo com a marca. Alguns supermercados sabem explorar muito bem esse
aspecto usando as degustações de forma inteligente para criar um ambiente ainda
mais envolvente para seus shoppers.
Parte V: Construindo um contexto que faz sentido emocional para os
shoppers
Enquanto a experiência cria a
conexão com o shopper em diversos níveis e os sentidos o envolvem, é por meio
da comunicação que podemos criar um contexto relevante para o shopper
converter-se em um comprador. Mas qual é o significado de relevância?
A relevância da comunicação e da
oferta de uma marca acontece a partir da compreensão da mente do shopper. Ou
seja, como ele pensa, quais são suas estratégias de decisão e consequentemente,
como age. Essa é a diferença entre um lançamento de produto e o que chamamos de
“arremesso de produto”. A mesma comparação pode ser feita entre um tabloide de
ofertas genérico – cujas promoções são em sua maioria itens que o shopper não
compra – e uma mala direta com ofertas personalizadas. Isso sim é relevância. A
Macy’s, rede americana, tem mais vários tipos de catálogo de ofertas, um para
cada segmento, configurado diferentemente para cada um deles.
Somente com um contexto relevante
é possível usar a emoção para mover o shopper e influenciá-lo a favor de uma
marca ou varejista. Já sabemos que os cinco sentidos tem um papel importante
como estímulo emocional, que o contexto é que cria o clima, agora falta apenas
o fechamento. Nesse ponto é preciso usar a emoção para reduzir o arrependimento
potencial com a compra do produto. Eu sempre cito o exemplo dos garçons
argentinos. Eles são treinados para retorquir com uma expressão de aprovação
como: “Excelente, señor!” quando fazemos um pedido, qualquer que seja. Isso nos
encoraja por que acreditamos que estamos ordenando o melhor prato da casa, a
sua especialidade.
No autosserviço é possível
reduzir o arrependimento potencial com a compra fazendo o shopper sentir-se
menos culpado por gastar seu dinheiro com produtos de consumo. Quando um
varejista sinaliza que um produto é o mais vendido, um “best seller”, como a
TESCO inglesa em seus pepinos espanhóis, isso reduz o risco de uma decisão
errada por parte do cliente. Doações imediatas para causas nobres e selos de
qualidade, por exemplo, têm efeito semelhante nos shoppers – reduzem o risco.
Resumindo, para usar a emoção a
seu favor é preciso de uma chamada (call to action) poderosa, direta e
principalmente, que seja relevante no contexto de vida do shopper. São mais de
vinte mil opções no ponto de venda e apenas 30 minutos em média para converter
mais um shopper. Tenho certeza que vale a pena. Afinal, considerando sua
fidelidade a marca de varejo, quanto vale um shopper a mais para sua loja, na
perspectiva de uma vida toda? Qual é o ROI (retorno sobre investimento) que
justifica investir em shopper marketing? Pense nisso. Voltaremos a esse assunto
(valor de um shopper para o varejista ao longo de uma vida – ou customer life
time value) em breve.
Por: Rafael D’Andrea é fundador
da ToolBoxTM e diretor da Agência Shopper. Atua como professor de marketing do
Insper desde 2009 e é coordenador e co-autor dos livros Shopper Marketing (ed.
Atlas 2011) e Trade Marketing (Ed. Atlas 2010). Compartilhe suas opiniões
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Publicado: 23 -jan-12